Enquanto despia a alva branca que envergava, após ter acolitado na Eucarístia de Domingo, a criança atira sobre a sua catequista: "Quem é o pai de Deus?" Sim, porque se Jesus é filho de Deus, de quem será neto? E não faz sentido, tão importante entidade ser filha de pai incógnito. Resumiu a criança de oito anos, na sua ingenuidade e curiosidade, milhares de anos de ateísmo militante. Quantos tratados já se escreveram sobre o tema, quantos ilustres pensadores já dissertaram sobre as origens da religião e das crenças. Mas até hoje, ninguém consegiu através da razão responder à inocente pergunta da mais inocente criança. Também nenhum tratado de Teologia ou Epístola Papal tem a desejada resposta.
Não vou ser eu a responder, claro que não. Tenho para mim a resposta, mas há perguntas que cada um de nós tem que ter a sua própria resposta. Trouxe esta criança à Luz da Lua apenas para me ajudar a introduzir um outro tema, mais terreno, mais meu. Porque insitimos todos - sem excepção - tentar encontrar através da Razão resposta para todas as questões, sendo que a maioria delas - diz-nos a mesma Razão - não tem resposta racional. Porque nos tentamos esconder de tudo o que não conseguimos explicar, mas sentimos, atrás da nossa pretensa racionalidade? Porque se foge do que não compreendemos, mesmo que nos sintamos bem com o que não tem explicação? Porque nos é tão díficil assumir um "não sei, não importa, não quero saber" e nos preocupamos apenas a viver o mais intensamente possivel o que sentimos, mesmo sem saber o porque o sentimos? Que interessa saber se Deus tem pai?
Existe medida para tudo. E a Razão não é a medida certa para os sentimentos, nem para as emoções. Apenas os reprime, ofusca e mata. Não os consegue medir.
Eu vivo um turbilhão de emoções. Habitam em mim sentimentos maiores que eu. Que por falta de espaço - e não sou propriamente pequeno - por vezes transbordam, e como qualquer enxorrada, não escolhem o caminho certo, nem anunciam hora e fazem vítimas não escolhidas. Mas uma coisa garanto: não vou perder tempo em tentar racionalizar. È contraproducente. Quanto mais me preocupar em controlar racionalmente os efeitos do que sinto, menos me dedico às suas causas. E são sempre as causas que devem ser combatidas ou acarinhadas. As causas do que sentimos são o verdadeiro motor do tractor que puxa as nossas vidas. E acredito que as causas nos são sempre conhecidas, podemos em querer não as assumir ou revelar, escondendo-nos atrás da falta de Razão para elas.
O tempo foge. Vai e já não volta. Como a Vida, ao passar, torna-se irrepetível - a minha, a vossa, ou uma qualquer vida. Sem Razão, ou por muitas razões induzidas ou deduzidas. Mas o que importa é o facto de só termos uma, e não raras vezes, apenas dispômos de uma oportunidade de a agarrar, em tempo.
A paixão e o amor à Lua trouxeram-me a consciência do tempo, das perdas de tempo, da falta de tempo, da importância dos tempos que passam e não se repetem. Trouxe-me também a convicção que o que realmente me move e contenta, me importa e marca, são os sentimentos que transporto e transmito, as emoções que vivo e faço viver. Tudo o mais é razão pura. Tudo o mais, são tratados dedicados a explicar a uma criança de oito anos, o que não tem sequer explicação. Déscartes há "alguns" anos atrás fez também a sua "Crítica da Razão Pura", arrasando Kantianos e Hegelianos. A mim, não me importa ter razão. Não sou um pensador, não quero fazer mais um inútil tratado sobre o meu pensar ou o dos outros. A mim, apenas me interessa conseguir viver o tempo que sempre foge, no mundo das emoções e deixar transbordar os sentimentos. Hoje acredito que hà coisas que ou se vivem ou se pensam nelas. Prefiro viver. Fácil? Não. Fácil é elaborar teorias, construir problemas e muros. Fácil é escrever textos - como este - que querendo dizer muito, não serve a ninguém. Dirigir sentimentos, aproveitar emoções, viver o tempo a tempo com paixão e amor, é - pelo menos para mim - mais díficil. Mas, porque a Lua existe, não vou ser dado a facilidades. E tudo farei para lhe conseguir dár resposta - um dia atrás do outro - através do meu sorriso e mão estendida, à dúvida do ano passado neste mesmo dia. É isso que me faz sentido, sem Razão ou razões. Mas com muito desejo. E com desejos de sem Razão ser feliz a fazer feliz.
Prefiro o risco de tentar, ao cómodo - embora não pareça - que é apenas querer arranjar razões que a própria Razão desconhece. Prefiro o beijo ao suspiro. O abraço ao aceno. O transpirar à lágrima. O perder tempo a amar ao ter tempo demais para pensar nisso.
Deus tem pai. Por muito estranho que pareça, é pai de si próprio. Mas isso até uma criança de oito anos sabe.
É quase Natal e não é fácil escrever o que sinto. Fiquem bem, à luz da Lua.
domingo, 23 de dezembro de 2007
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2 comentários:
A adjectivação continua a ser uma coisa fantástica... O que se consegue dizer, ou melhor será que dizemos alguma coisa?
Não se tem que racionalizar sentimentos, mas sim atitudes...
Seja muito bem vinda à luz da Lua, Pedra.
Gosto muito de saber que concorda - finalmente - que os sentimentos não se racionalizam. És decerto mais feliz assim. E claro que por vezes está muita coisa dita, mas poucos o conseguem comprender. Acontece a todos. Começando por Déscartes, Kant e Heguel...
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