terça-feira, 30 de setembro de 2008

A fresta dos olhos molhados

Os olhos lentamente vão ficando molhados. Ao olhar através de uma fresta da parede suja. Empoleirado num lavabo nojento, ele olha para ela, para o seu amor sonhado. E ao som da música que ela dança, daquela fresta, por ele rasgada, na velha parede, os seus olhos tristes e cansados, desfocam e transportam-no. Levam-no de volta ao momento em que no passado, o seu futuro sonhado, se cruzou com ele. “Olha bem para ti!” - disse-lhe. E ele olhou, compreendeu. Ela queria ganhar o Mundo. Ele lutava apenas para não se perder. Ele estava condenado a lutar e falhar. Ela ia ter tudo. Menos o seu amado, o rapaz sujo e esfomeado, que ela amava. Mas não queria, porque queria mais. Ele, daquele lavabo imundo, anos e anos depois, voltou a ver-se, voltou a encontrá-la.
E o seu futuro foi isso mesmo. Dois pares de olhos molhados. Um mais sofrido que o outro, mas tristemente molhados. Anos depois de se terem encontrado. De se terem perdido.

E é com esta história, que eu me levanto a meio da noite. E que vou voltar à cama.
Fica o registo de uma cena que nunca esqueci, de um dos meus filmes de eleição.
“Era uma vez na América”. Quando o passado fala ao futuro, para olhar para o seu presente. É sempre tarde demais. Como agora.
É tarde, vou tentar dormir um pouco.

Boa noite. Fiquem bem à luz da Lua

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