domingo, 22 de junho de 2008

Tese de doutouramento ou eu em Marte

Ontem foi um daqueles dias capazes de marcarem uma vida. E capazes de a marcarem de várias formas, em que todo o tipo de marcas são possiveis. Um daqueles dias, que aquelas pessoas, como eu, que se dizem conhecer muito bem, têm medo que aconteçam. Sei o quanto sou instável, e por isso imprevísivel, quando confrontado com situações e estados de alma que não domino, que me são cruéis, capazes das mais extemporâneas reacções, reveladoras dos meus medos e inseguranças. Aqueles dias em que fechados sobre nós mesmos e nos nossos males e devaneios somos capazes de arruinar tudo o que nos é mais querido, de nos fazermos mal e a quem nos ama. O dia de ontem começou comigo perdido, completamente destroçado por um inexplicável entrelaçado de sentimentos e emoções confusas e disformes, que me faziam suar quente e frio e a custo me deixavam respirar. Via tudo a côr preta, incapaz de reagir à dor que sentia e me fazia sentir no mais pequeno, abandonado e desprezível ser. Que mal me podia ter feito! Que marca nos poderia ter deixado! Foi como testar a teoria das probabilidades fumando um cigarro sentado encima de um jerricam a vazar combustível. Assim começou o dia, assim estava eu.
E heis que por entre tamanha nuvem negra a cuspir raios de energia negativa, mesmo à distância de meia Europa, paciente, carinhosa e abnegadamente me resgatáste para uma viagem especial, espacial. Lenta mas segura, descobriste o caminho de me levar contigo para porto seguro, para o planeta encantado, que é o teu.
Quando, mais tarde no dia, ingenuamente te pedi, que um dia me levasses contigo numa dessas tuas fugas espaciais, já tu me tinhas andado durante horas a passear de mão dada, a apresentar toda a beleza desse mundo, que é tão teu. Só quando adormeci tomei consciência de onde estava, que o que via e ouvia era resultado de uma viagem de sonho. Muito querida e esperada, mas que me ofereceste realmente quando mais precisava dela, inesperadamente. E hoje ao acordar senti-me sorrir.
Recordei o dia de ontem, e a partir dele quase toda uma vida. Recordei os dias amargos em que nada fazia sentido, em que nem sequer se procurava um sentido, por falta de forças e convicções. Recordei os dias tristes passados em tristes companhias, com os sentidos embriagados pela facilidade do prazer. Recordei a falta de consciência com que encarava essa triste forma de vida e como ela era um fim em si mesma. Recordei o quanto me transformei numa triste personagem que se alimentava de uma imagem que criara para consumo externo e que chorava por falta de essência a cada noite em que decidia ter que dormir.
Revivi a noite em que Deus (sim porque eu acredito Nele, e hoje ainda mais, porque sei o quanto é meu amigo) colocou à minha frente a possibilidade de reabraçar a essência esquecida. Revivi esse abraço que te dei. Revivi os dias que se seguiram e em que voltei a ter motivações e convicções. Em que, a custo, consegui voltar a fazer funcionar os "Ticos e Tecos" hibernados e quase moribundos. Revivi as noites com sono, mas que não dormia, para conseguir entender o que de tão especial estava a sentir, e que me fazia querer alguém mais que alguma vez me tinha querido a mim mesmo. Revivi o gosto único, inexplicável e inesquecível de um beijo que, não tenho dúvidas, me recolocou no lado certo da vida.
Passei em revista as horas e dias de momentos tão especiais, vividos com a intensidade de uma vida. Com vontades e receios que desconhecia ou tinha esquecidos, abandonados numa qualquer cratera do meu triste subconsciente. Voltei a ouvir as frases que me deram ânimo para seguir o novo caminho. Revi os gestos carinhosos e a busca a medo, mas confiante, que fizeste de ti e de mim.
Reli o "medo assustado" e todas as outras pérolas que fomos capazes de escrever, para nos provocar, para nos conhecermos, para nos testármos, para criarmos consciência. Voltei a travar conhecimento com planetas e sapos perdidos, que no momento me assustaram mas deram ganas de insistir, perseverar, ir mais fundo. Voltei a olhar a Lua de perto e a cantá-la por a saber "sempre lá, mesmo que não a visse". Confrontei-me novamente com os teus desabafos "a fundo negro", que quantas e quantas vezes me espicaçaram a alma e o querer, que me guiaram por um mundo que desconhecia e que passei a querer também meu.
Olhei para mim e vi que tinha renascido. Olhei para ti e para o teu cachecol às riscas arco-íris e percebi porquê. Percebi o porquê de todos os dias ter vontade de entrar nesse teu mundo, mesmo que como "intruso", a vontade de fazer com que não me expulssásses e gostásses da companhia. Percebi porque a Lua terá sempre um trovador atento e companheiro. Percebi porque os poetas cantam, gritam, sussurram palavras que antes não entendia e agora lamento não ter sido eu o primeiro a escrevê-las para ti.
Agradeci todas as noites em que assisti às tuas lutas por me fazeres mais feliz. Noites que custavam a passar, mas que tive o grande previlégio de ser o objectivo e o objecto. Agradeci todas as conquistas a dois. Todas as conversas intermináveis que nos oferecemos e nos fizeram crescer mais que anos de tertúlias. Agradeci aos construtores que plantaram tantos parques de estacionamento nas nossas cidades. Agradeci a capacidade de me emocionar e chorar. Agradeci ter conseguido "estar lá" sempre que que os teus silêncios pediam ajuda. Agradeci pela "melhor praia do mundo", pelos momentos em que o "palhacito" se soltou e arrancou as gargalhadas que hoje animam a minha ausência.
Que manhã bonita a de hoje! Que sensação a de acordar contigo, mesmo contigo tão longe. Que bom foi ouvir o teu "Bom dia Amor" e ficar deitado a ver tudo isto a acontecer à minha frente.
Aprendi que sempre que viajavas a Marte ias à procura da paz e compreensão que não encontravas a teu lado. Procuravas um lado da vida (de uma vida qualquer) mais fácil e bonito que sabias merecer e te era tão díficil de viver no meio de tanta complicação e dificuldade. Percebi que as viagens pararam quando sentiste não haver mais necessidade de procurar tão longe. Percebi que partiste imediatamente para lá, quando me sentiste em perigo e que me quizeste pôr a salvo.
Valeu a pena o sofrimento de ontem. Valeu a pena a errância de tantos anos. E vai valer a pena teres aberto a porta do teu mundo e da tua vida a este ser, que ontem entendeu finalmente, quando se viu no espaço, que te ama muito, mas não mais que o tanto que tu me amas.
E assim, estou hoje de convicção renovada, que o caminho percorrido nestes últimos 14 meses (curioso como as datas, sem querer se repetem), é imparável. e que depois desta visita a Marte, a próxima estação, seja ela onde fôr, estará muito próxima e será a dois.

Para ti Lua, com todo o meu Amor.

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